O Estado Novo foi uma das fases do período em que Getúlio Vargas esteve na presidência do Brasil. Essa foi a fase ditatorial do seu governo e estendeu-se de 1937 a 1945, tendo como grandes marcas a censura e a repressão aos grupos opositores. Essa ditadura foi iniciada por meio de um autogolpe que aconteceu com a divulgação do Plano Cohen, e só se encerrou quando os militares forçaram Vargas a renunciar.
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O Estado Novo surgiu em 1937, quando Vargas realizou um autogolpe com a outorga de uma nova Constituição para o Brasil. Essa fase ditatorial do seu regime, no entanto, foi resultado de um processo em que ele promoveu uma crescente centralização do poder em suas mãos. Em outras palavras, o regime autoritário foi construído por Vargas ao longo da década de 1930.
Desde a sua ascensão ao poder, Vargas demonstrou uma inclinação para o autoritarismo e para a centralização do poder. Ao assumir como presidente provisório, ele procurou adiar a realização de eleição presidencial e a elaboração de uma nova Constituição para o Brasil. De toda forma, pressionado, acabou cedendo, assim uma eleição indireta foi realizada e uma nova Constituição foi promulgada em 1934.
A fase dita Constitucional (1934-1937) foi, na verdade, o período em que Vargas realizou o maior número de ações para construir o autoritarismo, uma vez que a lei da época estipulava que ele não poderia disputar a reeleição na eleição presidencial de 1938. Assim, Vargas encontrou na “ameaça comunista” a desculpa perfeita para continuar no poder do Brasil.
Esse argumento passou a ser explorado por ele, principalmente, a partir de 1935, quando aconteceu no Brasil a Intentona Comunista, a tentativa fracassada de golpe realizada pelos comunistas da Aliança Nacional Libertadora. Esse acontecimento deu força a Vargas e, segundo o historiador Thomas Skidmore, permitiu-o convencer parte da elite que a solução do país era um governo autoritário.|1|
Entre as medidas tomadas nesse período e que contribuíram para a construção do autoritarismo, está o decreto da Lei de Segurança Nacional, em 30 de março de 1935 (portanto, antes da realização da Intentona Comunista). Essa lei dava amplos poderes ao governo para combater “atividades subversivas” que atentavam contra a “ordem social”.
Além disso, o temor da atuação dos grupos comunistas no país era tão grande que o Congresso brasileiro concedeu a Vargas os amplos poderes que ele desejava. Quando aconteceu a Intentona, a situação piorou. Vargas conseguiu aprovar o Estado de Sítio, a Lei de Segurança Nacional foi endurecida, e outras leis autoritárias foram aprovadas.
Além disso, as polícias passaram a contar com a conivência das autoridades para utilizar da tortura como forma de repressão aos movimentos de esquerda e das forças opositoras. O governo também criou, em 1936, o Tribunal de Segurança Nacional, que condenava rigidamente aqueles que eram enquadrados na Lei de Segurança Nacional.
Como mencionado, o grande feito de Vargas foi ter conseguido convencer as classes média e alta, além do próprio Exército, de que o caminho para a modernização do país e o combate ao comunismo exigiam a implantação de um regime autoritário. Assim, esses dois grupos apoiaram e seus representantes participaram ativamente do golpe.
Esse endurecimento e fechamento do Brasil resultou no golpe do Estado Novo em novembro de 1937. Vargas utilizou-se da divulgação do Plano Cohen como estratégia para implantar o regime autoritário. O Plano Cohen foi divulgado em setembro de 1937 e consistia em um documento falso que falava sobre um revolta comunista em preparação no país.
Esse documento falso acabou sendo explorado pelo governo para criar um clima de pânico no país. Em outubro, direitos constitucionais foram suspensos, e, em novembro, veio o golpe. Em 10 de novembro, tropas do Exército cercaram o Congresso, uma Constituição autoritária foi outorgada (imposta), e Vargas anulou a eleição presidencial que aconteceria em 1938.
Esses eventos deram início à ditadura varguista conhecida como Estado Novo. O golpe que aconteceu no Brasil foi apoiado por muitos parlamentares e teve apoio crucial de elementos da sociedade civil e das Forças Armadas. Alguns nomes que o apoiaram foram Góes Monteiro, Francisco Campos, Olímpio Mourão, entre outros.
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O Estado Novo estava de acordo com a tendência do autoritarismo político que existia no mundo da década de 1930. Desde a década de 1920, uma série de regimes autoritários tinha sido implantada em diferentes nações, e, no caso do Brasil, o Estado Novo foi construído tendo como inspiração o fascismo, implantado na Itália, e o salazarismo (também conhecido como Estado Novo) em Portugal.
Apesar da inspiração ideológica, Thomas Skidmore sugere que o Estado Novo foi uma construção pessoal de Getúlio Vargas.|2| A grande marca do Estado Novo foi a centralização do poder, pois este, que antes era dividido entre Governo Federal, estados e municípios, passou a concentrar-se nas mãos de Vargas e do Governo Federal.
O Legislativo, naturalmente, foi enfraquecido. Isso é facilmente identificável, pois, no dia do golpe, o Congresso foi cercado e fechado. As assembleias estaduais e câmaras municipais também foram fechadas com o início do Estado Novo. A intervenção do governo também aconteceu no Executivo, por meio da nomeação de interventores para governar os estados brasileiros.
Esses acontecimentos reforçam o que foi mencionado. Atribuições importantes que antes estavam nas mãos de estados e municípios foram repassadas ao Governo Federal, e a intervenção de Vargas nos governos estaduais contribuiu para reforçar o seu poder, já que a nomeação dos interventores levava em consideração o apoio que esses forneciam ao governo.
A centralização do poder em todas as esferas possíveis garantiu a Vargas amplos poderes e enorme capacidade de negociação política. O líder autoritário interveio na economia, na política e na administração do país de maneira ampla. Sua forma de governo foi responsável pelo enfraquecimento das oligarquias e dos regionalismos que ainda existiam no país.
Vargas procurou integrar economicamente a nação, e, para isso, incentivou o desenvolvimento econômico e habitacional/populacional de locais pouco integrados, como o Norte e o Centro-Oeste. Além disso, teve no ufanismo (nacionalismo extremo) uma grande ferramenta de propaganda política, pois seu governo, por meio de muitos intelectuais da época, procurou reforçar o sentimento de pertencimento brasileiro.
Havia uma forte propaganda política que ressaltava os feitos do governo e omitia as críticas feitas pela oposição. Tanto a propaganda política quanto a censura eram obra do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Este também promovia uma espécie de culto à imagem de Vargas, por meio de publicações em revistas e jornais e também pelo rádio.
Por fim, Vargas combateu a existência de um sistema político no país, e isso pode ser percebido pelo fato de que não existiam partidos políticos brasileiros durante o Estado Novo. Mesmo grupos políticos que apoiaram Vargas foram perseguidos e reprimidos nesse período, como foi o caso dos integralistas.
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Na década de 1940, sobretudo a partir de 1942, Getúlio Vargas realinhou a sua política e procurou conquistar uma nova base de apoio. Esse reajuste na estratégia política de Vargas foi muito bem pensado, uma vez que ele percebeu que, com a Segunda Guerra, a manutenção de um regime ditatorial era inviável.
Desse reajuste estratégico de Vargas nasceu o trabalhismo, uma prática política que defendia uma intensa atuação do Estado na economia e tinha como foco a criação de uma legislação que concedia direitos até então inexistentes para a classe trabalhadora. O objetivo de Vargas era garantir o apoio dos trabalhadores para caso surgisse no país um novo regime democrático.
Com isso, uma série de direitos trabalhistas foram criados por ele nos anos finais de sua ditadura. Entre os destaques, podem ser citados a criação da Justiça do Trabalho, em 1939; o decreto do salário mínimo, em 1940; e a criação da Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943. Vargas também ampliou a legislação previdenciária e sindical do país e realinhou seus discursos, tendo nos trabalhadores o seu grande alvo.
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O fim do Estado Novo está relacionado diretamente com dois acontecimentos: o envolvimento do Brasil na Segunda Guerra Mundial e a aproximação de Vargas dos trabalhadores. No primeiro caso, o Brasil declarou guerra ao Eixo em 1942, depois de realizar negociações diplomáticas com os Estados Unidos que incluíram benefícios econômicos para aquele país.
O envolvimento do Brasil na Segunda Guerra Mundial criou uma grande contradição, pois o governo tinha enviado soldados para lutar pela democracia na Europa, mas aqui mantinha uma ditadura. No caso da política trabalhista, a questão envolvia as bases de apoio do governo: os militares.
A aproximação de Vargas dos trabalhadores incomodava os militares e parte da elite econômica que apoiava o governo. O alinhamento com sindicatos e trabalhadores era visto com muita desconfiança, e isso fez com que Getúlio passasse a ser atacado por esses grupos. A exigência por um regime democrático no país ficou perceptível com o Manifesto dos mineiros, documento que exigia mais democracia no território.
Vargas até tentou contornar a situação ao realizar medidas que promoveram certa abertura política do país, e assim foi permitida a fundação de partidos políticos e uma eleição presidencial foi convocada para 1945. A ideia de Vargas era continuar no poder, mas dessa vez por meio de um regime democrático.
Sua estratégia não deu certo, e o desgaste da relação de Vargas com os militares era tão grande que, no dia 29 de outubro de 1945, esses realizaram um ultimato exigindo a renúncia do presidente. Vargas renunciou e no dia seguinte já estava a caminho de sua terra natal, o Rio Grande do Sul.
Depois de sua renúncia, o Brasil foi governado interinamente por José Linhares, presidente do Superior Tribunal Eleitoral, até o dia 31 de janeiro de 1946. No período de três meses em que esse esteve no poder, foi realizada a eleição que colocou Eurico Gaspar Dutra como presidente do Brasil. Isso deu início a uma nova fase da República brasileira, conhecida como Quarta República.
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Notas
|1| SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Getúlio a Castello (1930-64). São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 54.
|2| Idem, p. 64.
Crédito das imagens
[1] FGV/CPDOC
[2] FGV/CPDOC