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Crônica

A crônica é um gênero textual que registra e relata pequenos acontecimentos da vida cotidiana, em conjunto a uma interpretação pessoal do autor, que pode ser reflexiva e/ou crítica. Suas características são muitas, pois é um texto que permite a mistura de diferentes tipos textuais, por isso é chamada de gênero híbrido. Podemos encontrar crônicas poéticas, jornalísticas e até argumentativas. Todas elas, entretanto, trabalham com acontecimentos triviais, ou seja, fatos simples do cotidiano.

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O que é crônica?

A crônica é um gênero muito antigo. Em seu surgimento, ela era utilizada para relatar acontecimentos em sequência temporal. Com o tempo, o gênero se modificou e ampliou suas características, tornando-se, também, um gênero poético, crítico, reflexivo ou humorístico, por exemplo. Assim, podemos dizer que a crônica é um pequeno texto que registra fatos da vida cotidiana, por meio de um olhar artístico ou argumentativo.

Um cronista pode narrar um fato que viu ou viveu. Por exemplo, ele pode falar sobre uma atitude tomada pelo atendente do caixa da padaria, ou pode falar sobre a sua resposta (do cronista) a esse comportamento. Após fazer o pequeno relato, o autor vai expor uma interpretação pessoal sobre o acontecimento, tentando mostrar um detalhe quase imperceptível.

Voltando ao nosso exemplo inicial, digamos que o cronista fosse um jovem que, ao ir à padaria, foi chamado de “senhor” e, por causa desse acontecimento, começou a refletir sobre a passagem do tempo, sobre o crescimento e a maturidade individual. Essa reflexão não tem uma relação direta com o fato, mas esse fato desperta a reflexão no autor, gerando a crônica.

Características da crônica

A crônica é um gênero textual híbrido, ou seja, apresenta uma mistura entre diferentes características textuais, por exemplo:

  • pode ser mais jornalística, quando se concentra na representação dos fatos;

  • pode ser poética, quando apresenta uma linguagem simbólica e lírica;

  • pode ser crítica/reflexiva, quando apresenta opiniões pessoais do autor, e

  • pode apresentar mais de um desses tipos.

Sendo assim, a crônica apresenta diferentes possibilidades linguísticas e estruturais. A depender da escolha do autor, ela pode variar de forma, estética e até no uso da linguagem, às vezes sendo mais informal, outras mais poética, etc. De qualquer modo, a primeira característica central da crônica, independentemente do estilo, é o relato de fatos cotidianos. A crônica deve partir de um fato trivial, acrescentando uma reflexão pessoal do autor.

Além disso, a crônica é um gênero curto com características narrativas, descritivas e argumentativas. Ela apresenta pequenas histórias, seguidas de uma interpretação pessoal do autor; utiliza a descrição para caracterizar espaços, personagens e outros elementos que sejam importantes para o texto; e usa a argumentação quando deseja defender um ponto de vista.

Tipos de crônica

A inspiração da crônica pode surgir de lugares simples, como uma tarde no parque.

A crônica é flexível e híbrida, por isso pode apresentar diferentes tipos. Cada tipo indica a predominância de uma ou outra característica. Abaixo segue uma explicação dos tipos mais conhecidos e utilizados.

  • Crônica jornalística: relata fatos do cotidiano, utilizando uma linguagem mais objetiva, descritiva e impessoal (evita expor muitas opiniões pessoais).

  • Crônica poética: é um gênero literário e pode narrar fatos reais ou criar fatos fictícios, desde que tais fatos sejam possíveis na realidade das personagens. A sua característica predominante é o trabalho com a linguagem. Esse tipo costuma utilizar o simbolismo, jogos de palavras e figuras de linguagem, por exemplo, para expressar os fatos e suas interpretações.

  • Crônica humorística: é aquela que apresenta os relatos e interpretações por um viés do humor, da ironia e da sátira. Pode ter um caráter mais reflexivo, quando usa o humor para propor um pensamento leve; ou pode ter um caráter crítico, quando usa o humor de modo ácido para tecer suas opiniões e argumentos.

Veja também: O que é literatura?

Exemplos de crônica

Agora que você já conhece as principais características da crônica e também sabe que ela pode apresentar diferentes formas e linguagens, vamos analisar um exemplo: uma crônica escrita por Luis Fernando Verissimo, em “Comédias para ler na escola”.

A bola

O pai deu uma bola de presente ao filho. Lembrando o prazer que sentira ao ganhar a sua primeira bola do pai. Uma número 5 sem tento oficial de couro. Agora não era mais de couro, era de plástico. Mas era uma bola.

O garoto agradeceu, desembrulhou a bola e disse “Legal!”. Ou o que os garotos dizem hoje em dia quando gostam do presente ou não querem magoar o velho. Depois começou a girar a bola, à procura de alguma coisa.

Como e que liga? — perguntou.

Como, como é que liga? Não se liga.

O garoto procurou dentro do papel de embrulho.

Não tem manual de instrução?

O pai começou a desanimar e a pensar que os tempos são outros. Que os tempos são decididamente outros.

Não precisa manual de instrução.

O que é que ela faz?

Ela não faz nada. Você é que faz coisas com ela.

O quê?

Controla, chuta...

Ah, então é uma bola.

Claro que é uma bola.

Uma bola, bola. Uma bola mesmo.

Você pensou que fosse o quê?

Nada, não.

O garoto agradeceu, disse “Legal” de novo, e dali a pouco o pai o encontrou na frente da tevê, com a bola nova do lado, manejando os controles de um videogame. Algo chamado Monster Baú, em que times de monstrinhos disputavam a posse de uma bola em forma de bip eletrônico na tela ao mesmo tempo que tentavam se destruir mutuamente.

O garoto era bom no jogo. Tinha coordenação e raciocínio rápido. Estava ganhando da máquina.

O pai pegou a bola nova e ensaiou algumas embaixadas. Conseguiu equilibrar a bola no peito do pé, como antigamente, e chamou o garoto.

Filho, olha.

O garoto disse “Legal”, mas não desviou os olhos da tela. O pai segurou a bola com as mãos e a cheirou, tentando recapturar mentalmente o cheiro de couro. A bola cheirava a nada. Talvez um manual de instrução fosse uma boa ideia, pensou. Mas em inglês, para a garotada se interessar.

A crônica acima apresenta o relato de um fato cotidiano entre pai e filho. O pai compra um presente, a bola, mas esse presente parece sem graça e sem função para a criança. A sequência de fatos leva o pai a refletir sobre as mudanças entre gerações. Os objetos, que já tiveram um lugar importante, começam a perder o valor para as novidades. Por meio de um texto engraçado e divertido, o cronista nos permite refletir sobre um detalhe aparentemente trivial.

Como fazer uma crônica

A crônica pode apresentar diferentes formas, mas, ainda assim, possui características essenciais. Pensando nisso, segue uma lista com dicas sobre como fazer sua própria crônica.

  • Escolha uma situação do cotidiano.

  • Reflita sobre as curiosidades que essa situação desperta em você.

  • Escolha uma estética para seu texto: pode ser um texto de humor, crítico, poético ou reflexivo.

  • Comece o texto com uma breve narrativa da situação cotidiana que inspirou sua crônica.

  • No desenvolvimento, exponha suas ideias, análises ou curiosidades sobre a situação do cotidiano.

  • Conclua sua exposição com uma reflexão ou uma frase de efeito impactante.

Por Talliandre Matos

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